Por Pamela Ribeiro, coordenadora de programas no GIFE
A mais recente edição do Censo GIFE aponta para uma tendência de um campo de investimento social privado mais doador. Isso não significa maiores volumes de recursos repassados a terceiros, mas um número crescente de investidores sociais e atores da filantropia adotando o grantmaking como estratégia principal de atuação.
As motivações que influenciam um investidor social na escolha de sua estratégia de atuação podem ser diversas e muito particulares de cada organização. Este artigo sistematiza as quatro principais razões para o grantmaking declaradas por oito investidores sociais privados que tiveram seus casos retratados no GrantLab em 2023.
1. Reconhecimento da legitimidade e do poder transformador das organizações da sociedade civil (OSC)
Há um reconhecimento pelo investimento social privado de que já existe no campo um conjunto de organizações e iniciativas atuando e gerando transformações efetivas. Há também o entendimento de que estas são as organizações e iniciativas com maior legitimidade e conhecimento para lidarem com os problemas socioambientais existentes. Como foi explicado no caso da B3 Social, existe “a percepção de que potenciais soluções para desafios socioambientais encontram-se muito mais em organizações que atuam nos territórios ou na linha de frente do que nos financiadores”. Por isso, a opção por financiá-las, ao invés de criar novas iniciativas que potencialmente nem o mesmo poder transformador teriam.
2. Entendimento da importância de fortalecer as organizações e iniciativas da sociedade civil
Para uma democracia forte, é necessário uma sociedade civil organizada igualmente fortalecida, atuando com autonomia e independência, de acordo com seus valores e visões. Essa é uma das razões mencionadas por alguns dos casos retratados pelo GrantLab para justificar a atuação como grantmaker, como o do Instituto ACP e o do Instituto Ibirapitanga, que afirma que “a escolha por realizar doações se dá a partir da visão de transformação que a equipe do Instituto tem, a qual defende que a sociedade brasileira conseguirá lidar com problemas e desafios estruturais à medida que contar com organizações da sociedade civil fortalecidas, colaborando e interagindo entre si, formulando suas próprias teorias de mudança, construindo coalizões e estratégias de enfrentamento e exercendo controle social sobre o governo”.
3. Percepção de que o grantmaking gera mais retorno
Há um entendimento por parte dos grantmakers de que, diante de desafios tão complexos e sistêmicos, não existe uma solução única capaz de resolvê-los por completo, além de que constituir uma equipe própria de especialistas em várias áreas do conhecimento para a execução de projetos próprios é custoso e desafiador. Portanto, se já existem organizações e iniciativas efetivas no campo, financiá-las e somar esforços a elas acaba sendo mais eficaz e eficiente e gerando melhor retorno. A exemplo do caso retratado pela Umane, que justifica o grantmaking da seguinte forma: “Essa é uma estratégia para, além de fortalecer atores e organizações locais, desenvolver e apoiar iniciativas robustas e estruturantes, promovendo uma abordagem sistêmica para desafios complexos, tal qual o campo da saúde precisa”.
Existe ainda a percepção de que o grantmaking pode gerar melhores resultados pelo seu potencial de diversificação das temáticas e localidades e de ampliação da escala e do impacto, como observado no caso do Instituto Localiza: “Enquanto Instituto empresarial, o Localiza compreendeu que não faria sentido criar uma estrutura que conseguisse ser capilar e estar em diferentes locais e regiões do Brasil. Seria um investimento muito alto com a montagem dessa estrutura e de uma equipe com competências, que não traria a mesma transformação que o grantmaking”.
4. Possibilidade de somar esforços e atuar de forma colaborativa
O grantmaking é a estratégia de atuação escolhida por investidores sociais privados que buscam uma ação mais coletiva, em especial por meio do cofinanciamento. No caso do Movimento Bem Maior, por exemplo, o modelo escolhido reúne um conjunto de filantropos individuais que optaram por doar de forma colaborativa. Segundo a instituição, esse modelo proporciona aos filantropos um “espaço de aprendizado, para que cada um desses integrantes possa se desenvolver e perceber a importância da atuação coletiva e colaborativa em um país com diversas demandas sociais”.
Há ainda o modelo dos fundos independentes, a exemplo dos casos do Fundo Agbara e do Fundo Positivo, em que uma estrutura organizacional é criada com o intuito de reunir recursos financeiros de fontes diversas e distribuí-los a organizações ou iniciativas, em geral de base, que estão atuando em territórios ou temáticas específicas. Os fundos independentes são, portanto, grantmakers em sua essência.
Como apresentado no caso do Fundo Positivo, “ao invés da própria empresa montar uma operação, o que demandaria alto investimento financeiro de infraestrutura e para a constituição de uma equipe capacitada, a vantagem fica em apoiar um fundo que tem a capilaridade nacional para ser responsável por fazer a distribuição e acompanhamento de recursos para as organizações selecionadas em todo o Brasil”.